Com Celso Altoé. Formado em História e Administração de Empresas pela UFES – Universidade Federal do Espírito Santo, com especialização em Administração pela Universidade de Columbia – Nova York, ele expõe aqui um pouco de suas idéias:
Repercussões das Guerras. Qualquer guerra sempre tem conotações muito graves para as pessoas do mundo inteiro. Com a globalização, não há mais possibilidade de fazer guerra ou paz, sem que a pessoa que esteja do outro lado do mundo não sofra as conseqüências benéficas ou maléficas. Em termos de valores financeiros não é difícil quantificar os prejuízos da guerra. Falam em torno de um trilhão de dólares anuais pela indústria da guerra, que promove esses conflitos no mundo inteiro. O que é mais grave, no entanto, são as perdas humanas, as vidas ceifadas nesse percurso, que poderiam gerar mais riquezas e recursos se não fossem ceifadas por essas próprias guerras. Calcular custo de uma guerra seria praticamente impossível se considerarmos as coisas dessa forma, a não ser pelo aspecto financeiro, que é mais relevante ao meu modo de ver.
Guerra da Informação. Já está acontecendo a guerra da informação. Tudo que se faz hoje no mundo é informação e quem chegar primeiro consegue beber água limpa como se diz na gíria popular. Tanto japoneses, quanto americanos, chineses, alemães, sempre primam pela informação. Essa é a guerra que pode conduzir a outras próximas guerras, se elas acontecerem, mas provavelmente vão deixar de acontecer. Um passo além da guerra fria, uma guerra gelada, guerra da informação. No Brasil a guerra que existe é a guerra da fome, guerra da falta de informação, de educação, o que falta no Brasil é um sentimento de solidariedade mais profundo. Em Venda Nova do Imigrante nós temos muitos exemplos de solidariedade, mas pelo que eu conheço de Brasil, o egoísmo ceifa muitas vidas, e vai continuar fazendo isso por muito tempo. A guerra do consumo induz as pessoas a consumirem o que não podem, provoca um espírito belicista muito forte, que induz a pessoa a praticar atos violentos até pela frustração de não conseguir o que almeja. Se eu verificar que em uma placa tem várias coisas escritas e eu não consigo ler, eu sou um cego. É o que acontece com o Brasil. Porém o Brasil tem uma série de vantagens em relação aos outros países do mundo, porque é um celeiro de matéria-prima praticamente inesgotável. Recordo que há algum tempo eu estava lendo uma revista alemã e ela dizia que a dívida externa brasileira seria paga três vezes só com o resultado do minério que existia em Carajás. Imagine o que tem no Brasil além de Carajás. Isso foi há 30 anos, hoje nem se fala mais em Carajás. O Brasil tem um potencial muito grande e se a gente dividisse o Brasil em cinco países, provavelmente teríamos cinco países maravilhosos. Hoje uns produzem muito e outros nem tanto. O que tem sobrando aqui passa para o lado de lá, do lado de lá não se resolve o problema porque não produziu, então gera uma série de problemas sociais que não se resolvem nunca. Se esse país que fosse separado tivesse a responsabilidade de fazer a sua própria sobrevivência, provavelmente nós teríamos cinco países maravilhosos. Sul, norte, nordeste, sudeste e centro-oeste são regiões com características diferentes, e com potenciais excepcionais para sobreviverem no cenário mundial, não só no cenário latino-americano. Nós temos um problema de magnitude territorial que é uma desvantagem, não uma vantagem.
Chave reversora. Amar ao próximo como a si mesmo eu acho que é a chave de tudo. Mas para fazer isso, nós teríamos que proporcionar a oportunidade para as pessoas saberem o que pode ser feito em termos de educação, não só a educação formal de faculdade, mas até a própria cultura do povo, a formação, a indução das pessoas ao consumo. A gente teria que chegar em um ponto de informação tal, que a própria pessoa que estaria sujeita a informação em relação ao consumo. Para que ela tivesse discernimento necessário para definir o que ela pode e o que ela não pode comprar, o que pouca gente consegue discernir. Ela recebe informação e não tem potencial para analisar se pode ou se não pode, ela simplesmente quer tudo e às vezes nem necessário é. Religião é importante, escola é importante, solidariedade é fundamental. Cito neste contexto a Pastoral da Criança que me parece um exemplo fantástico da Drª Zilda Arns. Ela consegue, com o trabalho que iniciou, controlar 323 mil pessoas voluntárias que cuidam de 1.715.000 pessoas à um custo de R$ 1,67 mês/criança. Isso que é realmente inclusão social. Não existe no mundo inteiro, pelo menos ao meu modo de ver, nada semelhante a isto. É significativo demais. Os órgãos de divulgação dão pouco enfoque a esse tipo de informação. Fala-se muito em programas de televisão em crimes, drogas, assaltos, mas os exemplos bons não são citados. Talvez se falasse mais dos exemplos bons do que dos ruins, muitas pessoas que hoje estão ruins, copiariam os exemplos bons. Se reportando ao inicio do mundo, por exemplo, quando Caim matou Abel, deu muito mais ibope do que os irmãos deles que eram bonzinhos. Eles quase não são citados na Bíblia.
Essência da paz. Solidariedade. Conhecer a si mesmo para poder fazer alguma coisa. Aceitar os seus limites e produzir o que você pode produzir. Não adianta saber muito se você não passa nada para os outros, você é um inútil. A raiz da sociedade é essa interação. Um animal social ele é social porque ele se relaciona com as outras pessoas, ele tem sócios. Se a pessoa não se relaciona efetivamente, para o bem das outras pessoas, não tem sentido de existir. A raiz exatamente é isso: interação e produção de resultados positivos.
Agente pacificador. Qualquer gesto de atenção, qualquer manifestação. Às vezes não falar é mais importante que falar. Um afeto, um carinho. É uma questão muito subjetiva e pessoal, não dá para colocar em manual que tem que ser assim ou de outro jeito. O mais importante é ter a propensão para a aproximação com as pessoas. Não precisa ser um gênio, um santo, um intelectual. Precisa ser uma pessoa, e pessoa não tem que ter rótulo, qualificação.
Livros. Verifico que muitas crianças e jovens não têm nenhum tipo de incentivo para poderem produzir alguma coisa. Eles ficam simplesmente relegados a seu destino, porque não têm oportunidades. Neste contexto, estamos fazendo uma biblioteca para os alunos e também para a comunidade, através da doação dos livros. Eu tenho livros lá em casa guardados há trinta, quarenta anos. Registraremos o nome e o endereço do doador, para que as pessoas que usarem esses livros também se sintam motivadas a doar livros. O projeto pode ser estendido. Vamos usar a escola Domingos Perim como modelo do projeto, mas pode ser difundido para outras escolas. Estamos fazendo um trabalho também no Colégio Rio Branco, outro aspecto de sociabilidade bastante significativo. Estamos montando um trabalho de apoio à escola, buscando parcerias com equipes do Brasil, do exterior, sem restrições. Esse é um apelo que faço: que as pessoas se coloquem à disposição desse tipo de trabalho e façam muito melhor. Tenho certeza que se mais pessoas aparecerem para serem voluntárias, vamos fazer um trabalho muito melhor.
*Publicada em 17/10/2006