‘Polenta móvel’ vai invadir o Palácio Anchieta

* Leandro Fidelis

Durante a comemoração dos 135 anos da imigração italiana no Espírito Santo, Venda Nova quer provar ser a cidade mais italiana do Estado. Na cerimônia, que será realizada nesta quarta-feira (18), às 17 horas, no Salão Thiago do Palácio Anchieta, em Vitória, o município será representado pelo Coral Santa Cecília, o grupo da cantarola, além do popular “Polenta Móvel”, o fogão a lenha com rodinhas que foi destaque no Carnaval deste ano na capital.

Durante o evento, organizado pelo Arquivo Público Estadual, será lançado o livro “Coleção Canaã: Colônias Imperiais na Terra do Café”, do sociólogo italiano Renzo Grosselli. Foi com base nos dados minuciosamentes levantados pelo pesquisador que o senador capixaba Gerson Camata, propôs a criação da Lei do Dia do Imigrante Italiano, a ser comemorado na data de 21 de fevereiro. Deste modo, o Espírito Santo ficou reconhecido, oficialmente, como o berço da imigração italiana no Brasil.

O projeto tramitava no Senado Federal desde 2001 e foi finalmente sancionado pela Presidência da República em 2 de junho do ano passado, sob o número 11.687, apesar da resistência de políticos dos estados de colonização italiana da Região Sul, que pleiteavam esse reconhecimento.

“Nós esperávamos há muito tempo a criação desta lei, que coloca definitivamente o Espírito Santo no mapa da imigração italiana no Brasil. Estamos muito felizes e vamos abrir as comemorações em todo o Estado a partir desta quarta-feira”, destaca Cilmar Francescheto, coordenador do Projeto “Imigrantes”.

Diante disto, não faltam motivos para a colônia ítalo-capixaba comemorar e almejar outros títulos. “Vamos aproveitar a oportunidade mostrar que temos cultura preservada e valorização dos costumes trazidos pelos nossos antepassados. Nós fazemos a cultura do imigrante italiano acontecer”, anuncia o secretário de Turismo de Venda Nova, Tarcísio Caliman, para quem o município deveria ser instituído capital italiana do Espírito Santo.

O livro

O livro é resultado de uma intensa pesquisa realizada por Grosselli, que procurou recuperar em seu trabalho “os vestígios da voz camponesa” por meio de documentos do Arquivo Público e de arquivos da Itália, com o apoio de publicações sobre o tema e de diversas entrevistas com descendentes de italianos no interior do Estado.

O eixo principal do trabalho é a formação e ocupação das colônias oficiais – organizadas na então província capixaba, durante o período imperial (Santa Izabel, Rio Novo e Santa Leopoldina) – tomando por base a imigração dos trentinos, habitantes da região norte da Itália (atual Região do Trentino Alto-Adige, antigo Tirol Italiano que naquela ocasião estava sob o domínio do Império Austríaco) e que foram os pioneiros na imigração italiana para o Espírito Santo, em fevereiro de 1874.

Os vênetos e os lombardos, bem como italianos de outras regiões e grupos de outras nacionalidades que ocuparam as colônias, também são objeto de estudo do sociólogo.

Colônias Imperiais foi publicado originalmente em italiano, em 1987, com o apoio da Província Autônoma de Trento. Foi traduzido pela escritora capixaba Márcia Sarcinelli e, após duas décadas, poderá ser finalmente conhecido pela maioria dos capixabas.

A obra já é referência para muitos historiadores, que a consideram como o mais importante trabalho já realizado sobre o tema no Espírito Santo. Conforme atesta a historiadora Gilda Rocha, autora de uma tese sobre a imigração estrangeira em solo capixaba: “Com rigor histórico e apurada análise crítica, Renzo M. Grosselli construiu em Colônias Imperiais um amplo painel da imigração italiana no Espírito Santo, além de fazer incursões preciosas no movimento de povos de outras nacionalidades que aqui se estabeleceram. É, sem dúvida, o mais completo estudo feito até o momento sobre o tema em nosso Estado”.

Mas, ao resgatar a história da ocupação das florestas capixabas, o autor traçou um amplo panorama sobre a história do Espírito Santo, abordando a participação dos povos indígenas, dos negros, bem como dos primeiros colonizadores.

Diversas fotografias, mapas, gráficos e tabelas ilustram as 534 páginas do livro. De acordo com o autor, um dos seus maiores objetivos era o de “preencher uma página quase em branco no tocante à historiografia italiana, completamente desconhecida no que se refere à colonização do Espírito Santo”, e abordando o “abandono das terras européias por parte de milhares de camponeses, e a ocupação de vastas áreas do território brasileiro”.

A primeira parte do livro trata da situação dos camponeses em sua terra natal: os problemas econômicos, crises, a miséria nos campos, o militarismo austríaco que dominava a região, entre outras causas que levaram à emigração.

Na segunda parte, o autor analisa a situação do Espírito Santo no contexto brasileiro: a população, o território, os índios, a escravidão, o problema da mão-de-obra, as vias de comunicação, entre outros temas. A terceira e última parte, Grosselli dedica à formação e ocupação das colônias oficiais pelos imigrantes. Ao final, os leitores poderão consultar uma lista com nome, sobrenome, local de origem e destino dos chefes das famílias provenientes do Trentino, que chegaram ao Espírito Santo de 1874 a 1900.

“Foi necessário, portanto, adentrar nos arquivos e transformá-los em um local privilegiado do nosso trabalho. Nisto, fomos assistidos pela sorte. Os arquivos trentinos são ricos em material, herdeiros do sistema administrativo austríaco, que legou-nos uma herança positiva neste campo. Mas também o Arquivo Público do Estado do Espírito Santo revelou-se riquíssimo em material, permitindo-nos colher uma vastíssima documentação”, observou Renzo sobre a realização do trabalho de reconstituição histórica.

A Expedição Tabacchi: um marco histórico

Um capítulo especial diz respeito à Expedição Tabacchi: a primeira grande leva de italianos para o Espírito Santo e que dá início ao grande fluxo de camponeses daquele país da Europa para a Brasil. O grupo era composto por 388 agricultores, da Província de Trento, em sua maioria, incluindo-se algumas famílias da Região do Vêneto. Para recrutar as famílias na Itália, Pietro Tabacchi enviou um amigo, Pietro Casagrande, que monitorou toda a expedição, junto com sua esposa.

Acompanhavam também o grupo o padre Dom Domenico Martinelli e o médico Pio Limana. Este último, fez um relatório sobre a viagem, publicado em abril daquele ano em um jornal do Trentino. De acordo com suas anotações, o navio La Sofia partiu do porto de Gênova em 03 de janeiro e, após 45 dias de viagem, ou seja, em 17 de fevereiro de 1874, finalmente entrou na baía de Vitória.

O desembarque dos passageiros, porém, teve início a partir do dia 21 daquele mês. “Os primeiros dois dias de viagem transcorreram sem problemas. Em seguida, sobrevieram dois dias de tempestade, que assustaram os camponeses. Já nas águas do Atlântico, a 16 de janeiro, o navio foi sacudido por uma terrível tempestade, que por pouco não nos fez afundar, e que durou dois dias inteiros.” relatou o médico.

Tabacchi, que era proprietário da fazenda Monte das Palmas, no atual município de Aracruz, desde a década de 1850, e mesmo tendo a possibilidade de se utilizar da mão-de-obra escrava, optou por contratar seus compatriotas para trabalhar na extração do jacarandá, uma madeira de grande valor comercial, com o intuito de exportá-la para a Europa.

A iniciativa, porém, fracassou devido às péssimas condições da Colônia Nova Trento, assim denominada pelo fazendeiro. Os italianos se rebelaram e logo abandonaram a região, exigindo lotes nos núcleos de colonização do Governo. Uma parte seguiu para as colônias do Sul do Brasil.

O autor

Renzo Maria Grosselli nasceu em Trento (Itália), em 1952. Sociólogo, é doutor em História pela Pontifícia Universidade Católica de Porto Alegre (RS). Publicou uma dezena de livros de cunho histórico-antropológico sobre a emigração trentina e italiana no mundo e, particularmente, para o Brasil.

Escreveu também alguns livros de poesia e trabalhou no campo da história oral. Atualmente trabalha como jornalista no jornal L’Adige, de Trento.

As obras da mesma série sobre a imigração italiana no Brasil são:

– Parte 1 – “Vincere o Morire – contadini trentini (veneti e Lombardi) nelle foreste brasiliane” – Santa Catarina 1875-1900 – Trento 1986.

– Parte 2 – “Colonie Imperiali nella Terra del Caffè – contadini trentini (veneti e Lombardi) nelle foreste brasiliane” – Espírito Santo 1874-1900 – Trento 1987.

– Parte 3 – “Dove cresce l’araucaria. Dal Primiero a Novo Tyrol – contadini trentini (veneti e Lombardi) nelle foreste brasiliane” – Paraná 1874-1940 – Trento 1989;

-Parte 4 – “Da schiavi bianchi a coloni. Un progetto per Le fazendas – contadini trentini (veneti e Lombardi) nelle foreste brasiliane” – São Paulo 1875-1914 – Trento 1991.

(* Fonte: Projeto Imigrantes- Arquivo Público Estadual)

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