Agroturismo e cooperativismo: duas histórias com muito em comum

O "Força Cooperativa" é o primeiro e o mais representativo monumento ao cooperativismo do mundo. (*FOTO: Leandro Fidelis).

 

Leandro Fidelis

Dois religiosos, dois legados. Nas montanhas do Espírito Santo, Padre Cleto Caliman reuniu a comunidade e criou a famosa Festa da Polenta. Um outro padre, o Theodor Amstad, por sua vez, plantou na Serra Gaúcha a semente do cooperativismo de crédito que depois germinou por todo o continente.

De Venda Nova do Imigrante, Capital Nacional do Agroturismo, fomos parar em outra “capital”, Nova Petrópolis (RS), desde 2010 a “Nacional do Cooperativismo”. Enquanto na cidade sede da Rádio FMZ são diversas as propriedades rurais produtoras de queijos, socol e antepastos, no Sul um roteiro histórico-cultural reconstitui os primeiros passos do cooperativismo na América Latina. Foi lá que em 1902 surgiu a Sicredi Pioneira, a primeira cooperativa de crédito latino-americana, em funcionamento até hoje.

Leandro Fidelis

Distantes quase 1.500 quilômetros uma da outra, as cidades capixaba e gaúcha têm histórias parecidas de mobilização das suas comunidades para o desenvolvimento social e econômico. O labirinto verde, principal atração da praça de Nova Petrópolis, é uma metáfora para ilustrar o perfil cooperativista de seus moradores: diante dos obstáculos, eles sempre encontraram a saída e, por isso, desfrutam de todo o reconhecimento.

Colonizado por imigrantes alemães, é difícil não ter uma família do município que não seja associada a uma das nove cooperativas locais, cinco delas fundadas na cidade. Do mais velho ao mais novo, todos têm uma história com o cooperativismo. “Quando guri, eu e outros meninos ganhávamos dinheiro fazendo bico e corríamos para a Sicredi para depositar. Com o dinheiro, comprávamos lápis para estudar. Crescemos junto com a cooperativa”, lembra Eraldo Loesch, 65 anos, agricultor aposentado.

O nome “Padre Amstad” batiza quase toda obra ligada ao cooperativismo em Nova Petrópolis: a praça construída em 1942, o memorial localizado no mesmo prédio da antiga “Caixa Rural” e a unidade de atendimento inaugurada no último dia 07 de janeiro, todos no distrito de Linha Imperial. São muitas as referências ao religioso suíço considerado o patrono do cooperativismo na América Latina.

Nova Petrópolis é um destino fácil. Fica a 90 quilômetros da capital Porto Alegre e a 32 quilômetros de Gramado. Em suas paisagens, a cidade guarda lugares que contam uma história de força cooperativa, trabalho e união. Com pouco mais de 18 mil habitantes, foi ali que um grupo de líderes inspirados por Amstad fundou a Sicredi. Nova Petrópolis preserva a vocação cooperativista por meio de diversas cooperativas e associações, o que muito nos lembra a realidade de Venda Nova, no Espírito Santo.

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Padre Theodor Amstad (1851-1938).

Nosso roteiro na cidade gaúcha inclui a primeira sede da Sicredi Pioneira RS (1903 a 1933, casa construída em estilo enxaimel em 1900, pertencente ao primeiro gerente, Joseph Neumann); a Igreja Católica São Lourenço Mártir, que abriga o mausoléu do Padre Amstad, a Escola Padre Amstad, a sede da Cooperativa Piá, além do Parque Aldeia do Imigrante e o Monumento Força Cooperativa.

Esse monumento, localizado na praça central de Nova Petrópolis, é o primeiro contato do visitante com a “Capital Nacional do Cooperativismo”. Inaugurado em 2002 por ocasião do centenário da Sicredi Pioneira, é o primeiro e o mais representativo monumento ao cooperativismo do mundo, segundo afirmação do ex-presidente da Aliança Cooperativa Internacional- ACI, Ivano Barberini, já falecido.

O monumento em rocha e metal constitui-se de sete pessoas representando as diversas profissões da época, que carregam uma pedra que “estava no caminho”, citada pelo Padre Amstad em 1900. O suíço se referia à união de pessoas com objetivos comuns para superar dificuldades. “As sete pessoas também representam os sete princípios do cooperativismo”, explica o guia turístico.

Leandro Fidelis

Arno Boone guarda até hoje a caderneta com os registros escritos em português e alemão.

A Sicredi Pioneira é a precursora do Sistema Sicredi, que hoje soma 106 cooperativas com 2,4 milhões associados. Para o contabilista aposentado Mário Konzen, 69, vice-presidente da cooperativa, esse é o valioso legado de Padre Amstad. “Ele fez uma grande obra de caridade, o cooperativismo, que teve impacto sobre a vida de milhares de pessoas.”

Vidas ligadas ao cooperativismo

O agricultor aposentado Arno Boone, 77, afirma ser o segundo cliente da Sicredi Pioneira. Em 27 de dezembro de 1937, quando Boone tinha um ano de idade, seu avô fez uma poupança na antiga “Caixa Rural”. Arno guarda até hoje a caderneta com os registros escritos em português e alemão. “Fiz mais de 20 financiamentos por meio da cooperativa e nunca deixei de pagá-los. Não imaginava que a Sicredi fosse tomar a dimensão do que é hoje.”

Moradores de Linha Imperial, onde tudo começou, o casal Rudi Krauspenhar e Noemia Zang se orgulha de morar no município. Mais que isso, afirma que a inauguração de mais uma filial da Sicredi no dia 07 de janeiro, naquele distrito, facilitou suas vidas. “Antes tinha que ir à sede do município quase diariamente para pagar as contas e realizar outros serviços bancários”, lembra Rudi.

Noemia conta que o cooperativismo vem de família. “Nossos pais e avós eram associados da Sicredi e de outras cooperativas de Nova Petrópolis. Eu consegui sobreviver e criar minha família por meio do cooperativismo, embora não tenha ficado rica (risos). A cooperativa te ensina a cooperar, trabalhar em grupo, essa união de pessoas é o mais importante.”

O vice-prefeito Gregor Hermann destaca a vocação local para lideranças. “Nova Petrópolis tem esse ar antes mesmo de entender o que era cooperativismo, porque há na população uma vontade de participar. É muito comum encontrar líderes no município. A existência de muitas cooperativas, até uma escolar, deixa mais fértil essa possibilidade de vocações naturais para manter essa filosofia forte”, afirma o vice-prefeito.

 
Nós também temos um sistema forte
 

Se Nova Petrópolis se orgulha de ser berço do cooperativismo de crédito na América Latina, tendo a Sicredi como referência principalmente no Sul do Brasil, o Espírito Santo conta com a força do maior sistema de crédito do Brasil atualmente: o Sicoob.

Arquivo

Cleto Caliman, o padre que fez toda a diferença em Venda Nova.

O Sicoob atua no Espírito Santo desde 1989. No Estado, há 87 agências da instituição distribuídas em todas as regiões capixabas. A construção de bases sólidas e a experiência com o trabalho desenvolvido inicialmente nas cidades do interior foram essenciais para o Sicoob consolidar o seu crescimento também na Região Metropolitana. A meta do Sicoob é ter agências em todas as cidades capixabas.

A partir de 2006, as instituições, que antes só atuavam com crédito rural, foram transformadas em cooperativas de livre admissão. Com isso, pessoas de todos os segmentos da economia passaram a poder ser sócias das cooperativas do Sicoob.

Quando o Sicoob se estabeleceu em Venda Nova, na década de 90, encontrou uma sociedade organizada e unida pelo desenvolvimento do município. E um nome estava atrelado a isso: Padre Cleto Caliman.

Se, por um lado, não há indícios de que ele tenha sido de fato cooperativista, do outro não se pode negar que foi a liderança nata desse homem que ajudou a imprimir o espírito de cooperação e organização na terra em que o Sicoob tinha acabado de chegar.

Antes da mesmo da cooperativa, Padre Cleto trouxe para Venda Nova o Colégio Salesiano, os Correios, o hospital, o clube social e até o telefone. Padre Cleto morreu em 2005 aos 90 anos.

A conclusão que fica após esse passeio cultural é que as duas cidades da reportagem têm muito mais em comum que apenas o “Nova” nos seus nomes. São lugares onde o povo não espera a sorte cair do céu, porque descobriu na própria história que juntos podem ir mais longe.

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