* Valdinei Guimarães
valdinei@radiofmz.com.br
Usar o conhecimento para construir ferramentas que podem melhorar a vida das pessoas não passa de sonho para muita gente, mas não para o estudante vendanovense Gustavo Falquetto (18). Ele criou, sozinho, uma máquina para acelerar a produção de adubo feito com restos de alimentos. Com o equipamento, o jovem inventor pretende beneficiar a escola onde estuda e dar melhor destino ao lixo do município.
Gustavo criou um aplicativo de celular que controla a máquina – Foto: Valdinei Guimarães |
Gustavo conclui neste ano o ensino médio na Escola Estadual Fioravante Caliman. A máquina que ele está construindo vai tornar mais rápida a produção de adubo feito com restos de alimentos, no processo conhecido como compostagem. A invenção do estudante reduz pela metade o tempo que o fertilizante leva para ficar pronto. Além disso, o método não produz o chorume, líquido contaminante que resulta da decomposição de matéria orgânica.
A máquina está em fase de desenvolvimento e ainda será aperfeiçoada. Ela é um motor com hélices para misturar o material que se transformará em fertilizante natural. O equipamento está provisoriamente montado sobre uma caixa com cerca de três metros de comprimento, mas o objetivo de Gustavo é utilizá-la em locais maiores. “Será possível montá-la com várias hélices em uma caixa de concreto, por exemplo, para fazer muito adubo. Quero criar uma usina de compostagem em Venda Nova”, planeja o inventor.
Ele trabalhou horas no projeto até conseguir colocar em prática – Foto: Valdinei Guimarães |
Quando estiver pronto, o equipamento será capaz de realizar todo o trabalho que hoje precisa ser feito manualmente. “Essa máquina terá sensores que vão controlar a temperatura e a umidade do composto. Se ela detectar algo fora do padrão ideal, vai agir sozinha. Se não, ela não vai precisar fazer nada, o que ajudará a economizar energia”, explica o jovem aspirante a engenheiro. Mesmo antes de estar terminada, a criação de Gustavo já lhe trouxe frutos. Ele ficou em primeiro lugar na categoria ensino médio da Feira de Ciências e Engenharia, que aconteceu de 12 a 15 de novembro em Vitória.
A máquina pode funcionar automaticamente e é acionada de forma remota pelo celular de Gustavo. Todo o projeto do equipamento, a programação da placa que controla os motores e do aplicativo para o celular foram feitos por ele. “Eu fui pesquisando na internet, lendo apostilas e conheci pessoas que me ajudavam por meio do computador dando orientações. Assisti algumas videoaulas umas seis vezes até entender e conseguir fazer o que queria”, conta ele. Para construir o dispositivo, ele usou peças doadas ou compradas.
Combinando conhecimentos
A ideia de criar a máquina surgiu no início do ano e foi um processo de evolução. Tudo começou em fevereiro, quando Gustavo passou a produzir adubo orgânico para usar na horta da escola. No início, tudo era feito manualmente. As cascas de alimentos eram misturadas com pó de serra e armazenadas em baldes plásticos. Depois de duas semanas, os microorganismos faziam a decomposição do material, que então seguia para um minhocário. Lá, levava mais duas semanas para se transformar em húmus, um tipo de adubo altamente nutritivo para as plantas.
Invenção rendeu prêmio na Feira de Ciência e Engenharia – Foto: Valdinei Guimarães |
Porém, Gustavo não estava satisfeito. Além de demorado, o método utilizado por ele até então produzia o chorume. O estudante pesquisou e encontrou formas de fazer a compostagem sem gerar o líquido indesejado. “O segredo é equilibrar a quantidade de carbono encontrado na serragem com o nitrogênio dos restos de alimentos. Hoje, consigo fazer o húmus sem criar chorume”, explica Gustavo.
Além de eliminar o resíduo, o estudante conseguiu acelerar o processo. Para isso, usa uma técnica que aumenta o número de microorganismos que fazem a decomposição do material. Para conseguir melhores resultados, ele pensou até no tamanho que os restos de alimentos devem ter. “As minhocas usam as cascas da batata como ‘casa’ para os filhotes. Isso aumenta a reprodução delas. Aí, o processo é acelerado, porque elas é que fazem o húmus”, detalha.
Invento pode dar lucro e ajudar o meio ambiente
Uma das aplicações que Gustavo vê para seu invento é no aproveitamento de resíduos gerados em Venda Nova. “Daria para usar o fertilizante natural para cultivar produtos orgânicos. Isso iria colaborar com nosso agroturismo”, defende o estudante. Para isso, ele planeja parcerias com empresas e com a Prefeitura.
No modelo de negócios que planeja, o inventor busca uma forma de aliar interesses comerciais com benefícios para o meio ambiente. “Uma parte da produção de adubo poderia ir para a escola. A outra, poderíamos usar para produzir alimentos para venda ao comércio a preços mais baixos. Em troca, os comerciantes nos mandariam seus resíduos orgânicos”, explica.
A mãe de Gustavo se orgulha da habilidade do jovem inventor – Foto: Valdinei Guimarães |
As palavras do adolescente são de quem se preocupa com problemas ambientais. Ele conta que não busca apenas ganhar dinheiro com a invenção. “Eu fico incomodado com a quantidade de resíduo orgânico que vai para o lixo todo dia em Venda Nova”, comenta Gustavo. Ele pretende fazer o curso de engenharia mecatrônica. “Cheguei a pensar em fazer engenharia aeronáutica, mas aí eu criaria armas e máquinas que destroem. Prefiro criar coisas que ajudem as pessoas”, explica.
Gustavo nem faz ideia, mas ele pode ser o exemplo de pessoas conhecidas como empreendedoras sociais. São aquelas que tomam iniciativas diversas para promover o bem social. Quem explica é Cláudio Boechat, professor e pesquisador do Núcleo de Sustentabilidade da Fundação Dom Cabral (FDC). “Esses empreendedores têm um sentimento de ideal. Eles escolhem um campo em que têm mais facilidade e tomam medidas para melhorar a vida de outras pessoas e da sociedade. O empreendedorismo social nasce de uma ideia e parte para o profissionalismo. É o oposto do que acontece no empreendedorismo clássico”, comenta Boechat.
Para a mãe de Gustavo, Bernadete Falquetto (55), o filho é motivo de alegria. “Ele passava horas se dedicando a esse projeto. Tinha semana em que só falava ‘oi, mãe’ e ‘tchau, mãe’! Eu fico admirada com a inteligência desse menino. Dá muito orgulho!”, conta Bernadete.