Fernanda Zandonadi
Das nascentes, quando muito, resta um fio de água que teima em correr entre a vegetação seca. Os poços artesianos, que garantiam o abastecimento de famílias inteiras, estão quase vazios. Há quem já precise apelar para os carros-pipa para ter um mínimo de água para tomar banho e lavar as louças. A situação crítica pode parecer distante, mas já está acontecendo em Venda Nova do Imigrante. O pior: as previsões de chuva não são muito animadoras para os próximos meses.
Nos vários trechos percorridos por nossa reportagem, onde famílias não têm abastecimento feito pela Cesan, percebe-se que a falta de água já é uma dura realidade. Em Lavrinhas, é preciso recorrer a carros-pipa para garantir água para algumas residências e para a dessedentação das aves das granjas, diz Marcelo Caliman. "Já tivemos que apelar para um carro-pipa porque a nascente secou. Não tem mais água", afirma.
"Casei há 40 anos e vim morar aqui. É a primeira vez que vejo uma crise como essa. A irrigação dos pimentões é feita à noite, por gotejamento, o que gasta bem pouca água. Mesmo assim, às vezes falta. Daqui à pouco, além de não termos água, não teremos mais comida, já que não dá mais para irrigar as plantas", conta Ida Caliman, também moradora da Lavrinhas.
Dulce Altoé, moradora da Tapera e proprietária do sítio Altoé das Montanhas, também sente na pele a falta de água. "Nossa nascente secou. Já tivemos que abastecer nossas caixas por meio do carro-pipa, para poder lavar roupa, uma louça, dar descarga. Nunca vi uma situação tão crítica. A nascente, às vezes diminuia a vazão, mas acabar, nunca".
Em Bananeiras, na zona urbana, a situação também é crítica para as famílias que dependem de poços artesianos. "Papai conta que abriu esse poço antes de eu nascer, há quase 40 anos. E ele nunca ficou em um nível tão baixo", conta Josi Nodari Zandonadi, mostrando o poço que abastece a casa da família e que hoje não tem mais do que 50 centímetros de água. "Ainda tem água porque a mamãe está economizando de todas as formas", relata.
O poço que abastece a residência em Bananeiras há quase 40 anos tem hoje apenas 50 cm de água
Poeira que vem da seca
Da propriedade de Laudeci Falqueto, no Alto Bananeiras, é possível ver um fio de água que escorre pelas pedras. É a cachoeira das Sete Quedas, que também sofre com a forte estiagem.
"Antigamente, alguns turistas paravam aqui na propriedade para tirar fotos da queda. A cachoeira estava cheia, bonita. Hoje, só vemos as pedras", conta o agricultor, apontando para queda por onde escorre apenas um fio de água.
Na cachoeira Sete Quedas, apenas um fio de água ainda resiste e escorre pelas pedras
Na região, as famílias convivem ainda com outro desconforto. Além da falta de água que já atinge residências que dependem de nascentes, a poeira da estrada de acesso à Torre de TV entra nas casas, invade os quintais e torna insuportável o ambiente.
Na propriedade de Laudeci Falqueto, por exemplo, ainda não falta água, que eles retiram de um poço. No entanto, a seca deixou a estrada que passa ao lado da residência com uma poeira fina. E os pesados caminhões que transportam pedras de mármore e granito fazem essa poeira subir.
"Um dia, o pessoal contou 90 caminhões subindo e descendo da pedreira", diz o agricultor. A casa de Laudeci vive fechada, numa tentativa de não deixar a sujeira entrar. Nas janelas, panos e jornais tentam fechar as frestas, também para impedir a entrada da terra seca. A tentativa é em vão. "Pensei em pintar minha casa, mas desisti. Daqui a poucos dias vai estar do mesmo jeito. É muita poeira".
A casa da família Falqueto permanece fechada noite e dia por conta da poeira
O que diz o poder público
Segundo o o chefe de gabinete da Prefeitura de Venda Nova, José Manoel Almeida Bolzan, o município se coloca à disposição da comunidade do Alto Bananeiras para uma reunião, junto às empresas de extração, para encontrar meios de minimizar o problema da poeira. "Há uma situação difícil, porque estamos vivendo uma crise de falta de água. Mas a ideia é sermos parceiros da comunidade", explica.
Além disso, segundo Bolzan, a prefeitura já pediu a inclusão da via no projeto Caminhos do Campo, do governo do Estado. "É uma questão que vai levar tempo, pois demanda projetos e recursos. Mas já colocamos a estrada de Alto Bananeiras e a de Bela Aurora, como prioridades", revela.
Sobre a estiagem, ainda não há previsão de decretar estado de emergência em Venda Nova, segundo Bolzan.
Incêndios
Somente nesta quarta-feira (14), os bombeiros foram acionados para combater dois incêndios na Região Serrana do Estado: um deles no Alto Tapera e outro em Soído de Cima, Marechal Floriano. "São muitos incêndios e parece que nos finais de semana aumentam as ocorrências", conta o sargento Eliamar, do 4º Batalhão do Corpo de Bombeiros, efetivo que atende às cidades das montanhas.
Incêndio em Alto Tapera consumiu boa parte da vegetação do local
"Temos feito um trabalho de conscientização junto aos proprietários. Hoje está proibido fazer queimadas, mesmo com o acero. É uma época que venta muito e o fogo pode passar para outras áreas", explica o sargento.
A situação é tão crítica que o comando do batalhão vai enviar um documento ao Ministério Público Estadual (MPES) com as ocorrências onde há indício de crime ambiental, ou seja, aquelas em que o fogo foi deliberadamente aceso. "Vamos mandar essas ocorrências porque há fortes indicativos de que o fogo começou de forma criminosa. Isso é crime ambiental. A ideia é que o Ministério Público investigue essas ocorrências para identificar em quais delas houve crime ambiental. Foi uma iniciativa nossa para tentar melhorar esse quadro", explica o sargento Eliamar.
O número de incêndios é alto e, para piorar a situação, há poucos homens na guarnição para atender a tantas ocorrências. Segundo o sargento Eliamar, em caso de incêndio são enviados quatro bombeiros para tentar sanar o problema. "Estamos com efetivo reduzido para atender a todos".