Universalismo

Humildade. Já viajei praticamente a Europa toda, com exceção da parte que era comunista. Conheço lugares da África, principalmente no norte. Morei na Inglaterra e na Irlanda por mais tempo. O mais importante, que quero destacar dessa vivência, é como é bom conhecer outras culturas, e através desse conhecimento, ficar mais consciente. Valorizando a própria cultura e a dos outros, a pessoa se torna mais humilde. Observo que muitos alemães chegam ao Brasil se achando o máximo, melhores que os brasileiros, porque chegam de um país industrializado, rico, que funciona e todo mundo ganha bem. Olhando isso com outros olhos e conhecendo a cultura brasileira, não penso assim porque vejo o lado bom do Brasil, vejo a força do povo brasileiro, vejo a luta deste povo e então respeito. É assim que a pessoa se torna mais humilde, conhecendo outras culturas, mas realmente conhecendo.

Motivação para conhecer o mundo. O que motiva uma pessoa a sair do seu país, ou da sua cidade, onde tudo é conhecido e enfrentar o novo, o desconhecido, num primeiro momento é a curiosidade. Depois vem a vontade de adquirir conhecimento e o gosto pela aventura. Sempre tive curiosidade, desde pequena leio muito. Com seis anos de idade, li três livros, da biblioteca, sobre outros países.

Idiomas. O mais difícil é o primeiro idioma estrangeiro, depois do primeiro os outros ficam bem mais fáceis. Acabei conhecendo inglês, alemão, francês e português. Tem sido pesquisado, e descobriram que diminui, em uma pessoa idosa a questão de “caducar”, ou seja, a pessoa fica lúcida por muito mais tempo. As pessoas idosas que estão mais lúcidas, geralmente falam mais que um idioma. Um bom exemplo disso é meu pai, que fala seis idiomas, tem 92 anos e está completamente lúcido. É muito importante aprender o idioma inglês, primeiramente, para quem quer viajar para qualquer lugar. O mundo inteiro tem o inglês como segunda ou primeira língua. Se você vai para o Japão, não fala japonês, se comunica em inglês; vai para a Itália, não sabe o italiano, se comunica em inglês. Inglês é o idioma de comunicação do mundo inteiro hoje. Outra questão é a internet. A grande maioria hoje utiliza a internet e parte dela fica fechada para quem não sabe inglês. O idioma é importante para a comunicação e para viajar é essencial.

Dificuldade e facilidade. O idioma é primeira dificuldade quando se chega num país. Sem comunicação é difícil, porque você só vai conseguir fazer as coisas mais necessárias. Chegando em um outro país, você liga a televisão, é inglês, liga o rádio, é inglês, vai à padaria, tem que falar inglês, resultado: você acaba tendo que aprender.

Situação pitoresca. Uma situação que fiquei constrangida foi na Inglaterra. Já falava muito bem inglês quando cheguei na Inglaterra, porém não sabia de certas expressões e gírias. Um dia estava tomando o café da manhã, sentada à mesa junto com uma família inglesa de classe média alta, tudo muito fino, todo mundo conversando, eu falava das diferenças de alimentação na Alemanha e na Inglaterra, dos costumes e cada um, mencionado o que gostava de fazer. Sempre gostei de comer aveia no café da manhã e falei em inglês que gostava de comer aveia. Deu-se um silêncio na mesa, todos olharam para mim, eu senti que tinha falado alguma coisa errada. De repente todos riram. Eu fiquei vermelha, não tinha entendido. Depois eles me explicaram, que quando você fala em inglês que “gosta de aveia”, na verdade você está falando que “gosta de sexo”. Eu tinha falado que gostava de sexo no café da manhã!

Saudade. Minha forma bem pessoal de lidar com a saudade é resolver isso antes de viajar, porque se eu realmente tenho ligações muito fortes com pessoas da família a saudade vai acontecer. Acho importante trabalhar isso antes de sair. Analiso se vou ser capaz de viver longe dessas pessoas, imagino a situação, converso com as pessoas, porque saudade sempre atinge mais que um. Trabalho este sentimento em mim para ver se realmente a vontade de sair é maior do que a saudade das pessoas. A vontade de sair, comigo vence. Mas é sempre bom as pessoas trabalharem isso antes de sair, porque irão enfrentar outras situações, outras pessoas, outro idioma, outros costumes, e isso não é muito fácil. Se bater uma saudade dificulta mais. É sempre bom saber antes se é capaz de vencer isso.

Família. Tenho meu pai, que mora na Alemanha, e tenho dois filhos que voltaram para a Alemanha, eles nasceram lá, Sarah e Davi. Sarah me falou há dois anos: “…mãe, aqui no Brasil não vejo possibilidade de estudar e conseguir um bom emprego, quero sair”. Imagina eu, mãe, falei que tudo bem, ela podia sair. Acho que não tinha direito de amarrá-la em mim. Na época ela tinha vinte anos. Era algo bom para ela, porque para mim, mais importante do que saudade, é sentir que minha filha está se realizando, está trabalhando e que está fazendo aquilo que vai ser bom para ela. Há um ano foi meu filho Davi, com 19 anos de idade, que falou: “mãe, também vou embora”. E foi para a Alemanha. Foi a mesma coisa, ajudei ele ir. Considero muito importante, como mãe, como pai, não fazermos chantagem emocional. Meus pais também não fizeram isso comigo quando quis ir para outros países, então aprendi a ir. Eu acho muito importante nós não prendermos eles. Tenho 52 anos de idade, não tenho tanto tempo de vida mais. Minha opção de vida é Brasil e Venda Nova do Imigrante, mas a opção deles é outra, por isso deixo eles saírem e não sofro com isso. Me sinto muito feliz em saber que estão fazendo o que os deixa felizes.

Amizades. Amigos que ficam “para trás” no meu país costumo manter contato por telefone ou por carta e quando volto parece que nem fui. Amigos ficam no coração, na mente, mantenho contato. Em outros países como, Inglaterra, Irlanda e Dinamarca, das amizades ainda tenho contato com algumas, mas a gente já faz as amizades sabendo que vai embora um dia. Essas pessoas ficam mais no coração, na mente. Aprendemos a agradecer por ter conhecido e convivido com essas pessoas e esse sentimento de gratidão já ocorre no momento do contato pessoal. Em vez dessa amizade ficar superficial, fica mais consciente na hora, porque se sabe que só naquele momento poderemos estar juntos. Vai haver a separação. Há um sentimento profundo, uma gratidão por ter estas amizades. Mesmo sabendo que há este limite, não tenho medo de fazer amizades.

Universalismo. Ser universalista é ser uma pessoa que tem um grande conhecimento geral e respeito a outras culturas. A favor da paz no mundo. Quando vivemos num lugar, nossa visão é limitada. À partir do momento que saímos e aprendemos que em outros povos e em outras culturas têm coisas boas também, nós podemos aprender com essas pessoas. Não se cria inimizades e fica muito mais difícil iniciar guerras. Penso que todas as pessoas deveriam viajar e conhecer outros povos, que é um primeiro passo para evitar conflitos entre estes povos. Penso que viver como universalista é isso. Respeitar, deixar os outros viverem os próprios pensamentos e um dos grandes resultados será a paz nesse mundo.

Aprendizado. O maior ganho foi o conhecimento que adquiri e que me ajudou a ser mais humilde. Mudou muito a minha forma de pensar. Continuo muito curiosa, não vou parar por aqui, devo conhecer mais alguns países, culturas. Brasil para mim, foi e está sendo uma experiência muito grande, gosto muito do povo brasileiro.

Posturas ideais com estrangeiros e turistas. Respeito. O brasileiro é bom nisso, ele tem essa fama no mundo. Posso dizer porque já conversei com muitas outras pessoas, de outros países, sobre os Brasil, sobre os brasileiros. O povo brasileiro é conhecido como um povo muito acolhedor, que trata bem o turista. Vamos esquecer daquela parte das grandes cidades, que são violentas, porque essas coisas também acontecem em outros países, mas em geral o povo brasileiro é nota dez!

Considerações finais. Fui bem recebida em Venda Nova do Imigrante. Demorei um pouco para começar a trabalhar na região, mas sabia que em lugares menores demora um pouco mais para as pessoas terem confiança no trabalho da gente, principalmente pessoas que “vêm de fora”, mas eu sempre fui bem tratada e respeitada. Aprendi a respeitar a forma de pensar diferente, de povos diferentes.

*Publicada em 16/10/2006

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